quarta-feira, 25 de junho de 2008

Para desistir

Sinceramente eu não sei o que pode ser feito. Sei que a muito tempo, algo emaranhado dentro de mim foi desfeito, por despeito seu. Livrou-me tão perfeitamente de um amor que começou torto e continuou crescendo assim, fim. Mas e aí? Precisava das garantias. Pretendo continuar com elas, como um amuleto ou quem dirá uma bússola. E elas dizem para eu ficar aqui, exatamente aqui. Então meus olhos, meu corpo, minha cabeça pedem cama, descanso da distância.
Olha, eu não alcanço aonde vão meus sonhos. Quisera eu aprender a estar em dois lugares ao mesmo tempo. Ah, mas talvez se eu tivesse uma escada, escolheria a escala da sua cidade e escalaria seu coração. Sabe que eu odeio ter as mãos atadas para te provar as coisas enfeitadas que vivo dizendo? Isso quando justamente estou sendo tão eu. Mesmo sem esperanças - ou assustadoramente cheia delas - continuo esperando.

Milena Lieto Samczuk

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Diário na calçada

Na noite fria, aparece de pés descalços. Não lhe importa se é na areia ou no asfalto. É só mais um lugar sujo do teu corpo cansado. Abre o jornal, mas não lê. É colchão, e as palavras o aquecem. Poderia dar conforto, se ao menos ele soubesse ler.

Acende o cigarro que achou jogado, tentando buscar o calor que a sociedade lhe nega. O pão velho que come é fruto de coleta seletiva. E ele também. E quem o seleciona para estar ali?Além de seletivo, descartável. Se morrer, é só mais um. Aliás, é menos um. Mais um que nasceu. Pra morrer.

Atravessa a rua e você também. Obviamente, para lados opostos. A minha pena têm distância certa, e quanto mais longe, melhor. E daí para o preconceito, é um pulo. Roupas rasgadas, cabelo sem jeito, sem cor, sem dinheiro,sem-teto, sem graça, sem sorriso, nem nada. Alma dispersa vagando na busca da sobrevivência de mais um dia. Futuro? Já ta difícil viver o presente, imagina pensar no futuro.

RG com novo significado: responsável geral. Quem? Eu, você, nós, contra a condição da contradição que é este país. “Brasil: um país de todos”. Todos quem? Para ele, não. Ele não tem nada. Não tem onde dormir, nem o que comer, sem pátria, nem direito, nem esquerda. Ele tem mais um texto que nunca vai ler.

Continuamos escrevendo em cima dele, o mendigo. E ele continua dormindo sobre elas, as palavras do jornal.


Guilherme Vilaggio Del Russo.

sábado, 14 de junho de 2008

Talvez pra um outro dia...

Abri a gaveta da cozinha em busca da bolacha que meu pai costumava comprar.Sabia que não teria. Entrei no computador pra buscar um novo amor. Cozinhei a salsicha em busca do gosto de macarrão. Esperei mensagem de madrugada. Dei dinheiro ao mendigo em busca de salvação e agradecimento. Olhei-lhe no espelho de lado, pra ver se o perfil ajudava. Acordei para ver o mar. Tentei procurar em meus armários roupas que nunca pude ter. E cartas também. “Onde está o perfume que eu gostei e nunca tive?”. Enxuguei a louça buscando orgulho. Fui a pé mas queria ir de carro. Hoje, um só meu. Atendi ao telefone com um novo jeito de dizer “alô” só para te agradar. Era engano. Acendi ao cigarro buscando conforto e bem estar. Abri a porta e não te vi.


Tem certos dias que eu me pergunto “Sou o único a esperar pelo improvável?”. Talvez.
Imagine pelo impossível.


Guilherme Vilaggio Del Russo

domingo, 1 de junho de 2008

Apenas

Ela não permitiu que o sentimento que conquistava seu peito descorresse junto com a conversa. Sorriu olhando para baixo, escondendo a vergonha. Ele fingiu ver as horas para tocar seu pulso, e ela manteve a mão firme, por mais que o terremoto por dentro a fizesse estremecer. Negou um beijo, dois, três. Ela estava sendo mais forte que um guerreiro em batalha. Mas a luta era interna. Três anos antes, jurava amor eterno. Agora se convencia de que havia o superado. O ódio, irmão do amor, era contido, refugiado no canto de alguma parte de seu corpo. Uma hora chegaria sua vez. Ela só não sabia que querer ia sempre, a mesma, a mesmíssima pessoa por todos os santos dias do resto da sua vida. Fingir não fazia de uma mentira verdade. Não, ela não o esqueceu. Eles ainda pensam um no outro, apenas não se pertencem mais.

Milena Lieto Samczuk