terça-feira, 23 de setembro de 2008
Primavera
Nunca conversou muito com o futuro, o papo dele era com o agora. Sua vida era um relógio que sempre caminha mas que não sai do lugar. A vida cobrava mudanças, novos ares, um tapa no paletó, novas ruas, um outro jeito de dizer “alô”, um bom-dia-nas-segundas-feiras (ele sempre odiou), outro ramal, um plano, um novo ano, uma nova vida, um novo e outro ele. E uma nova camisa social. Ele tinha que se adaptar.
Apesar de ser tipicamente o retrato-mal-falado do cara errado que daria certo, sentiu-se imensamente agradecido pelo oportunidade do que vinha a seguir.Desta vez, ele não fugiria. Era ele, e somente ele. Não se contentaria mais com o segundo lugar e deixaria de ser o resultado do igual e passaria a somar.
E então, quando percebeu, ainda estava em frente ao espelho. Perguntou-se quem era e logo se respondeu prontamente:
- Sou esse que segue adiante, que parece distante, caminhando ofegante, nesse perigo constante, que é viver. Procuro o “pra sempre”. Não me contento com o ontem. Nem com o hoje. E também não odeio as segundas-feiras. Meu dia predileto do mês tomou vida. Passou a ser sempre, o amanhã.
Algo havia, de fato, mudado.
Guilherme Vilaggio Del Russo
quinta-feira, 18 de setembro de 2008
Grrr
Mas é tão injusto. Como posso querer entrar em um jogo sabendo que vou perder, e perder muito, perder você. Não quero.
Pior é que sei onde encontrar as melhores sensações. Droga, eu deveria me sentir tão sortuda, só em saber que às vezes preciso muito de alguém. Você me faz tão bem e disso não posso fugir. Nem se eu me isolasse por dias. Nem se eu desistisse de abrir a janela e ver o sol, porque sei que ainda assim te veria. Mesmo de olhos fechados e no escuro, te veria. Ainda ouviria sua voz no silêncio. Droga!
Milena Lieto Samczuk
quarta-feira, 17 de setembro de 2008
República de Palhaços
O artista de hoje é boneco de mídia barata e vulgar quando deveria ser voz ativa da luta armada. Armada de palavras, caras e bocas contra aflições e problemas que o governo insiste em nos fechar os olhos. Mas chegou o mês da revolta. Outubro. Mês de eleição, indecisão. Artista se candidatando? Triste. Querendo criar leis e emendas quando deveriam questioná-las. No palco.
Palhaços que falam tanto. Palavras já apodrecidas pelo desgate do tempo. Não enchem barriga, só enchem linguiça. E sinceramente, que já me encheram o saco. Já deveriam ter se tornado ações.
quarta-feira, 10 de setembro de 2008
Preto e Branco
Era óbvio demais esperar demais que você me atendesse no final daquela tarde então liguei só para ouvir cair na caixa postal. Eu e ela já somos amigos íntimos.
Te ver é algo como me olhar no espelho e ver o reflexo invertido. Ao mesmo tempo que é me completar. Você é o sujeito (simples, feminino) da minha oração. E pensando bem, também é a minha oração de noite. O Vice e o versa, o sol a e chuva, a montanha e a praia, preto e o branco, e vice-versa. Engraçado que sem um, não existe o outro. É a arte imitando a vida.
Então, pego meu copo de alcóol (e você, de leite) e brindamos essa eterna distância, que nos une, que nos atrai, que nos separa. Afinal eu procuro o novo, e você é a última tecnologia. Sem manual, é claro.
A Matemática e a Gramática. Assim sou eu e você. Parecidos na pronúncia, distantes na prática.
quarta-feira, 3 de setembro de 2008
Quase Botas Batidas
E essa alegria quase infantil, que acabou por tomar conta do meu corpo, já cansado, quando Deus me deu a oportunidade de voltar e sentir tudo com outros olhos. O sorriso amarelo que voltou, o cigarro que ficou pra trás de uma vida que se confunde entre estar bem e fazer o bem. Essa minha risada descontrolada que hoje eu mal ouço, mas que pouco importa, é a forma de agradecimento sincero pra aqueles que estiveram comigo quando minha cama não queria me deixar caminhar sozinho. O gesto de criança é acenar pro medo da morte e lhe dizer, “tchau!”.
Hoje e amanhã, e qualquer outro dia que venha a ser bonito ou feio, eu continuarei em dívida com aquele que optou por me deixar mais um pouco pra crer e acreditar na boa vontade dos homens. Ainda reclamam da maldita mania que tenho de comprar relógios como se esquecessem que isso é forma lúdica de contar quanto tempo tenho para viver uma segunda chance. Leio nos lábios de vocês a mensagem que eu parecia ter esquecido: que eu ainda posso viver feliz, apesar dessas mãos calejadas. Não, a dó eu desprezo, e a pena se foi com aquela imagem do rapaz frágil que chorava pedindo desculpa pelo trabalho. Sou um pobre velho que se confunde com o novo prazer de sentir-se capaz de tudo. Novamente.
Aquele barulhinho animado dos pássaros se foi, mas veio o som (e as palavras) de mensagens que recebo e que me confortam, que me fazem seguir adiante, mostrando que o meu apartamento vazio é meramente ilustrativo.
Guilherme Vilaggio Del Russo